Chove nos campos de Cachoeira
“Voltou muito cansado. Os campos o levaram para longe. O caroço de tucumã o levará também, aquele caroço que soubera escolher entre muitos no tanque embaixo do chalé. Quando voltou já era bem tarde. A tarde sem chuva em Cachoeira lhe dá um desejo de se embrulhar na rede e ficar sossegado como quem está feliz por esperar a morte. Os campos não voltaram com ele, nem as nuvens nem os passarinhos e os desejos de Alfredo caíram pelo campo como borboletas mortas.
Mais para longe já eram os campos queimados, a terra preta do fogo e os gaviões caçavam no ar os passarinhos tontos. E a tarde parecia inocente, diluída num sossego humilde e descia sobre os campos queimados como se os consolasse. Voltava donde começava os campos escuros.
Indagava por que os campos de Cachoeira não eram campos cheios de flores, como aqueles campos de uma fotografia de revista que seu pai guardava. Ouvira Major Alberto dizer à D. Amélia: campos de Holanda. Chama-se a isso prados.
Alfredo estava cansado, mais cansado ainda talvez porque perdera o caroço de tucumã no princípio dos campos queimados. O caroço soltara da mão e se escondeu num buraco de terra. Então não podia compreender, nem mesmo fazia muito esforço para isso, porque era o que voltava mais fatigado, como que trazendo nos ombros a própria noite para o chalé.”
Dalcídio Jurandir,
Chove nos campos de Cachoeira, 1941.